2/06/2009

Fanzines Japoneses: a qualidade dos amadores


Por: Sérgio Peixoto Silva

Fanzine no Japão é como mato: tem aos milhares! Mas antes de tudo, é bom que se explique o porquê de tamanha produção por parte dos amadores e o porquê do monstruoso consumo de mangás pelos japoneses.

Que os japoneses consomem mangás aos quilos todo mundo já sabe, mas poucos sabem o porquê de tamanho consumo. Mangá é o nome que eles dão aos seus quadrinhos. A realidade é que depois da segunda guerra, os japoneses trabalharam pesado para reerguer seu país e transformá-lo na potência econômica que é hoje. Houve uma dedicação ao serviço que muitas vezes chegava-se a 12 ou 16 horas por dia uma jornada de trabalho. Era comum que se recusasse a sair de férias e, não restavam muitas opções de lazer aos japoneses, além de ler livros ou quadrinhos. Durante as viagens de ida e volta ao serviço, eles liam muito. Nos anos 50, período em que a maioria da população japonesa não tinha recurso, popularizou-se as casas de aluguel de mangás. Nos anos 60/70 elas deram lugar às livrarias como hoje conhecemos, e a lenta recuperação da economia japonesa trouxe dinheiro para o bolso do povo, que começou a dar-se ao luxo de comprar o que antes só podia alugar. Nos anos 80 a coisa explodiu, e algumas revistas semanais alcançaram a monstruosa marca de cinco milhões de exemplares vendidos semanalmente.

Como se vê, o mangá é algo enraizado na cultura japonesa há mais de três gerações. Chega-se tanto quanto o futebol e o samba para nós brasileiros. É natural que muitos leitores de mangá desejem um dia se tornarem também desenhistas ou roteiristas de mangá. E para isso, o primeiro passo é divulgar seu trabalho através de fanzines, que no Japão recebe o nome de doujinshi. Nesse ponto, o esquema funciona como no Brasil, juntando-se um grupo de amigos e dividindo-se as despesas e tarefas. A diferença começa na hora da produção.

No Japão, é comum gráficas e outras empresas envolvidas na produção de revistas ( fábricas de tintas, grampos para revistas, papel, etc. ) e as próprias editoras financiarem a edição dos doujinshis. Como resultado, eles têm um ótimo acabamento, alguns chegando a requintes com capas em acetato ou papel bem grosso, letras em dourado ou prateado na capa, miolo com papel de primeira, impressão profissional, etc. O resultado desse incentivo, são fanzines com qualidade de fazer inveja a maioria das revistas em quadrinhos profissionais do Brasil.

A linha de raciocínio dos patrocinadores é simples: Apoiando-se os novatos, eles estão de olho no futuro, quando alguns deles poderão se tornar profissionais. Assim sendo, poderão surgir séries de sucesso, com vendas de muitas revistas, mantendo-se assim, a cadeia produtiva. Artistas como Katushiro Otomo ( Akira ), Nobuhiro Watsuki ( Kenshin ) e Naoko Takeuchi ( Sailor Moon ) foram revelados através dos doujinshis.

O público que consome tais fanzines, os compram em livrarias especializadas, na Internet, pelos correios e principalmente em convenções que ocorrem mensalmente em vários lugares do Japão. A convenção semestral que ocorre em Tókyo, tem inscritos mais de 40 mil grupos de fanzineiros. Mas apenas os melhores acabam participando, reduzindo este número para 15 mil. O público que visita tais convenções chega às centenas de milhares e todos compram doujinshis.

Há fanzineiros que não querem deixar de lado sua liberdade criativa, e vendem seus trabalhos apenas em convenções. Alguns deles chegam a vender mais de 10 mil exemplares numa única convenção e ainda sobra gente querendo mais. É mole?

Com isso, podemos perceber o porquê da qualidade dos mangás. Com tantos candidatos a artistas profissionais, só os realmente bons terão chance de um dia publicarem nas grandes revistas de quadrinhos no Japão.

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