5/11/2010

Um salto de respeito na cena indie

Por: Júlio Ibelli

Quando os quadrinhos e rock compartilham as páginas de uma revista, ou ilustram a seção de tiras de um jornal, o que se vê na maioria das vezes é uma baciada de estereótipos: os homens são escrotos, gordos e porcos, cheios de piercings e tatuagens, e as mulheres, avoadas e sempre dispostas à uma transa fácil. Enfim, exemplares dos dois sexos inadequados à sociedade, sempre metidos nas aventuras mais sem pé nem cabeça jamais vistas. Existem alguns resquícios desse comportamento de risco, mas são espécies à beira da extinção. Para quem houve rock, sobreviver na selva de concreto nos dias de hoje não é mais ter uma camiseta preta com uma estampa do Iron Maiden, e andar com o cabelo comprido e uma calça jeans toda rasgada pelo centro das grandes cidades. Até os apaixonados por um som mais pesado não vem dispensando o uso de um Adidas no pé e um agasalho com algumas listras. Ser roqueiro hoje em dia é ter a rebeldia de um punk com todo o jogo de cintura de um intelectualóide como Fernando Henrique Cardoso. Não deve ser a toa que a cena independente brasileira vive uma nova era de esperança desde o mandato do nosso ex-presidente. Se você está completamente por fora da atual cena roqueira nacional, infectada pelo cenário independente - o único vírus do bem já identificado - um bom primeiro passo para começar a se atualizar é a revista Mosh! (Gibiteca Editora, 32 páginas, R$ 3), uma compilação do que há de melhor nos 'quadrinhos indie' do Rio de Janeiro. "A revista foi criada para ser vendida em casas noturnas e shows, em situações em que tudo que você menos quer é ter uma revista na mão. Sendo assim ela foi criada no formato de bolso, para não virar um transtorno", explica Sandro Lobo, editor da revista. Com impressão e papel de primeira qualidade, muito diferente do que costuma-se observar no primeiro número de um fanzine por exemplo, é quase um pecado reclamar do preço que a publicação é vendida. "A Mosh! não é um fanzine, onde jovens desenhistas treinam seus talentos", diz Lobo. Mas sim uma revista em quadrinhos especializada em música, com uma preocupação editorial, de conteúdo, impecável, "acredito que seja fruto da maturidade dos autores [a clareza das imagens e desenhos]", emenda Lobo. Você já está obsoleto se pensa que quadrinhos são só a Turma da Mônica e os heróis anabolizados, com capas e cuecas por cima da calça.

Vinícius Mitchell, 23, cartunista cujos trabalhos costumam freqüentar diversos salões de humor no Brasil, inaugura a Mosh! com 'The Helveticas'. Na história ele reivindica aos indies aquilo que à eles pertence: o culto antes secreto, reservado à grupos não muito numerosos, de bandas que não estão no catálogo das gravadoras 'majors', e que vem chamando a atenção de um número cada vez maior de pessoas de fora do mundinho independente. Essas bandas usufruem inclusive do poder de divulgação de um canal de televisão aberto por exemplo. Vendidos!, é o que grita indignado o protagonista. Em seguida vem 'The Cirrose Rock Band' para contestar tudo o que foi escrito nas linhas acima, com dois carinhas bem freak falando um monte de palavrão e comentando dos melhores show do mundo na opinião deles, em que asas de morcego são arrancadas com a boca em pleno palco, pintinhos são esmagados com botas cheias de espinhos e páginas da bíblia servem de papel higiênico. Mas percebam que até mesmo esses dois personagens tem topetes, uma barbicha e um piercing discreto na sobrancelha. Destaque para a letra da música que os dois tocam quando resolvem formar uma banda para parecerem com seus ídolos: 'O peido é o rock das pregas!! O peido é o rock das pregas, baby!!'.

Quem chega na seqüência é a sensacional 'Menina Infinito', de Fabio Lyra. Com essa história a Mosh! cumpre a sua missão de retratar fielmente a cena indie, sem clichês preconceituosos. Tudo contribui para o sucesso da história: o ritmo da narrativa, a falta das cores, o traço todo estiloso de Fabio, cenário, ângulos e até o figurino dos personagens, há camisetas para todos os gostos, Nine Inch Nails, Stereolab, Primal Scream. O enredo é muito bem bolado, confirmando a máxima, 'gosto não se discute, lamenta-se'. 'One Show Bands' fecha a revista ensinando que o importante é ter uma banda de rock, não importando sob quais circunstâncias. Mas não acaba por aí. Há ainda uma entrevista com os Autoramas, queridinhos da cena, e a coluna 'Comic Riffs', onde Heitor Pitombo mostra para o público um exemplo do humor escrachado que não é de intenção da Mosh! realizar. No segundo número os entrevistados serão do grupo carioca em ascensão Jimi James. "Acredito que temos um veículo que interesse às bandas", explica Lobo. Pelas páginas da revista também aparecem alguns anúncios de sebos, bandas e livros lançados de forma independente, alem de um anúncio de página inteira da famosa Bunker, casa de tradição roqueira carioca. "Sem dúvida nenhuma os contatos foram fundamentais, mas as pessoas só embarcaram porque acreditaram no projeto, no conteúdo editorial da publicação", explica Lobo, editor da revista junto de Renato Lima. Lobo também acumula a função de diretor de arte, barrando o que julga não ser apropriado para ser publicado. Renato também desenha ao lado de Vinícius, Lyra e de um outro Fábio, de sobrenome Monstro, que é descrito no site da revista como sendo 'a maior besta devoradora de cachorro-quente de porta de show'. Pode acreditar, sou testemunha disso. Quando pergunto ao Lobo se a Mosh! seria uma resposta à banalização de todo o hype criado em torno do cenário independente, ele me responde sem entender muito a questão, mas todo convicto: "A Mosh! não foi criada como forma de protesto. Foi criada da vontade dos desenhistas em fazer quadrinhos e falar de rock'n'roll. Não pretendemos que a Mosh! seja um produto ideológico. Como os autores da revista curtem músicas do cenário independente, decidimos fazer histórias para esse público". E parecem ter acertado em cheio.

5/07/2010

Perversão em Quadrinhos


Por:Leonardo Maia


A publicação `Hentai - A sedução do mangá´ traz uma visão histórica e crítica do fenômeno artístico

O bizarro, como seres surreais, aparece nas cenas de sexo!

O fascínio pela cultura pop japonesa tem crescido a olhos vistos. Se antigamente os produtos que traziam samurais e lutas marciais se colocavam na linha de frente, hoje os mangás e animês são o principal produto de exportação da arte nipônica. Um subgênero erótico do mangá, o hentai (que significa pervertido), tem público cativo no Japão e seu prestigio cresceu no Brasil.

Os primórdios do mangá datam do século XII, com as primeiras separações nítidas entre texto e pintura. O desenho aparecia com maior destaque que os textos, algo que ainda é regra geral no mangá moderno. A partir da Era Edo (1615-1868), os trabalhos se popularizaram, ainda como estampas independentes, trazendo uma única ilustração. Nesta época, já surgiu o primeiro filão erótico de ilustrações, conhecido como shunga, que podia ser vendido - ainda que de forma velada - como folhas avulsas ou em forma de livros.

Mas o fenômeno dos mangás como são conhecidos hoje, ocorreu a partir da década de 50. Hoje, essas revistinhas, que são lidas de trás para frente, chegam a tiragens de até um milhão de exemplares, tendo o Brasil e os Estados Unidos entre os maiores mercados. E o hentai segue como importante vertente, com um público específico e explorando desde o filão mais soft, chamado de ecchi, até os mais pesados como futanari (com hermafroditas), kemono (com animais) e ero-guro (com cenas de estupro, sexo bizarro e escatologia), passando por aqueles que preferem retratar garotas e garotos jovens (lolicon e shotacon, respectivamente).

Mesmo com uma imagem recatada e rígida, a sociedade japonesa é uma das que mais consomem produtos pornográficos, desde hentai até filmes eróticos e jogos eletrônicos pornôs. E os diversificados - e muitas vezes politicamente incorretos - temas explorados pelos hentai mostram que não há limite para a imaginação nipônica. Os mangás eróticos são considerados como válvula de escape para as fantasias do povo japonês que, se não costuma extravasar a sexualidade em ambientes públicos, pode assim fazer com os quadrinhos pornôs. E, mesmo quando tratam de temas problemáticos, como incesto, estupro e pedofilia, os criadores costumam justificar o trabalho como algo que não sai do papel, servindo inclusive como modo de evitar que tais atos ocorram na vida real.

Como bem ilustra o manual, o hentai - também conhecido como ero-mangá e h-mangá - se caracteriza por retratar os órgão sexuais masculino e feminino em tamanhos bem maiores do que o normal. Grande parte das imagens, porém, é publicada de modo distorcido ou com tarjas, devido à censura que se aplicou no Japão ao gênero, logo após a sua popularização. A Associação de Pais e Mestres, temerosa com a influência dos mangás eróticos entre as crianças, exige que o pênis e a vagina não sejam mostrados de modo explícito e que os pêlos pubianos não sejam representados. Estas restrições provocam conseqüências como a reprodução dos seios em tamanhos por vezes surreais (para compensar a omissão da vagina) e o rejuvenescimento dos personagens, por conta da ausência de pêlos, aludindo à pedofilia. Vale ressaltar que isso inclui apenas a produção elaborada para o mercado japonês, pois o material exportado não atende a essas exigências. Isso acaba alimentando o setor clandestino e também favorece a internet, que está recheada de imagens do gênero.

Convenções das fantasias

Um dos capítulos mais interessantes de Hentai - A sedução do mangá é Convenções do hentai mangá, que apresenta algumas das regras gerais que são seguidas pelos desenhistas. Numa rápida lida, já dá para perceber a tendência: mesmo que o gozo seja primordial, a posição da mulher tem que ser submissa. A sociedade japonesa é conhecida por ser especialmente patriarcal e machista e, como não poderia deixar de ser, os hentai mangás refletem isso. As personagens do sexo feminino aparecem, muitas vezes, em posições e situações humilhantes, atendendo a fetiches masculinos, vestidas de professoras, empregadas, enfermeiras e colegiais.

Para começar, a convenção número um já diz que todas as mulheres que aparecem nas histórias são bissexuais ou pelo menos vão descobrir que são, caso sejam expostas a essa situação. O homossexualismo, quando retratado, é quase sempre entre mulheres. Mais à frente, afirma-se que estupro não existe no hentai, pois, mesmo forçada, a mulher passa a apreciar e "até começa a pedir mais". Independente do tamanho do órgão sexual masculino, ela vai agüentar a dor do coito e ficará, inclusive, contente. Ao pegar o marido praticando adultério, geralmente aceita e até se junta aos dois. Já o homem é retratado sempre como um ser forte, dominador, com pênis gigante, capaz de ejacular quantas vezes for necessário e de "satisfazer de três a dez mulheres de uma só vez". A recorrência indiscutível de todo hentai é o ato sexual, como deixa claro a última das convenções: "E, finalmente, quaisquer personagens, a qualquer hora, em qualquer hentai mangá, farão sexo".


Dos quadrinhos para o cinema

Saindo dos quadrinhos para o cinema, o filme de Jonah Hex conta a história de um pistoleiro caçador de recompensas com metade do rosto deformado, que vive aventuras sangrentas no Velho-Oeste. Josh Brolin é o protagonista, enquanto o vilão, um praticante de vudu que pretende formar um exército de mortos-vivos, é interpretado por John Malkovich. Temos a participação da maravilhosa Megan Fox no papel de Leila, uma garota com habilidades com armas que será o caso amoroso do feioso. No elenco ainda participam Michael Shannon e Will Arnett. O filme tem estréia prevista para agosto deste ano. A distribuição é da Warner.